17 de mar. de 2015

Fala Tracer! Bidigo

Mais um "Fala Tracer!", uma coluna aberta a qualquer praticante da cidade pra falar sobre parkour de seu jeito.

Dessa vez, com nosso velho Bidigo.

Primeiro, gostaria de dizer que bidigo é babaca. Idiota. hahah Brincadeiras à parte, é difícil ver um comentário dele a sério. Mas de vez em quando ele diz umas coisas que valem a reflexão. E por isso eu roubei esses comentários dele de um tempinho atrás e resolvi postar aqui. 

Bidigo começou a treinar na mesma época que eu (há mais de 6 anos), e apesar de não treinar mais, ainda carrega um pouco do espiríto do parkour em sua vida.

Sem mais, seguem abaixo os comentários dele. Vale destacar que foram dois comentários de momentos diferentes, sem ligação direta entre um e outro, mas que acabam se conectando. Revisei pouco do texto dele, então, tá bem "jeito bidigo". 

Texto por Bidigo
Revisão por Gustavo Ivo




É o seguinte, nossa geração não foi a geração de tantos giros e de tantos vídeos. O que acontece hoje com a nova geração é um cara (que quer começar a treinar) que vai procurar um vídeo de parkour e chega lá e bota no youtube "parkour". Por ironia do destino cai um vídeo de shade... pronto, esse cara tá fudido se não tiver uma orientação boa ou uns caras que cheguem para ele e falem: - vei, isso não é "parkour"; e expliquem todo fundamento por trás dele.

O que fez nossa geração se apaixonar pelo parkour talvez tenha sido aquele espírito guerreiro que veio de Belle. Quem não se lembra do desafio do kalenji? Pois bem alguns aqui até participaram, mas duvido muito que essa geração dos vídeos esteja disposta a tal coisa. Creio eu que o que diferencia um iniciante de hoje para um de 05, 06, 07 anos atrás é essa vontade de ir até o final, de "eu vou fazer até acabar". Ainda existem uns que chegam assim dessa nova geração, mas são 10 em 100; a maioria quando sente a primeira fadiga depois de 05 min de quadrupedal, já tá arriado, saindo de fininho para fazer outra coisa. Acho que por isso esse cara não ganha um amor diferente pelo parkour, talvez até se encante, mas ter um amor acho que não.

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O parkour de hoje é muito diferente do parkour da nossa época e o da nossa época já é diferente que o dos primeiros caras daqui de salvador; como fallux, thiago xxx, luã, etc. Creio que o parkour em geral vêm a cada época se modificando e se adaptando às novas técnicas, modos de fazer algum movimento, assim como também tem movimentos que foram esquecidos nessa caminhada: técnicas que apareceram que não tem nada a ver com o fundamento em si do parkour -  aquela velha história do ser forte para ser útil.  Mas isso foi há,  sei lá, uns 10, 12 anos atrás em que a comunidade do parkour pensava basicamente da mesma forma, e hoje tá mais para " ser bom para botar no vídeo". 

Aquele espírito do parkour de antigamente poucos ainda hoje o possuem. Por outro lado, não acho que seja errado um cara girar ou fazer um monte de coisa que não serve para nada. Desde a minha primeira aula eu ouvi: "no parkour você é livre". Mas, pera aí, se eu sou livre por que tenho que me adequar a uma parada que meio que banaliza os giradores? Acho estranho que essa liberdade no parkour seja só para quem não "gira". Claro que em uma situação de emergência ninguém vai dar um salto mortal etc etc etc vai seguir seus instintos e vai fazer um monte de coisa que já treinou no automático.

É meio complicado, um lado sempre vai falar que está certo, mas o parkour ainda é uma criança, só começou a engatinhar para se dizer o que é certo ou errado. A história de "fazer físico, repetições de movimentos etc" como certo e é errado "girar", basicamente é isso. Mas, sei lá, cada um pensa de uma forma e não quer dizer que um dos dois lados esteja totalmente certo ou totalmente errado. Talvez  os dois estejam certos ou os dois errados, aí vai da cabeça de cada um..





11 de mar. de 2015

Desafio de Hércules

Texto por Gustavo Ivo
Revisão e fotos por Juliana Fajardini


27/fev de 2015

O que poderia ser uma sexta-feira normal para muitos, tornou-se um dia épico para quem compareceu no Imbuí. 

Dia de realizar o Desafio de Hércules. As 12 tarefas que os deuses fizeram para rir de você.




Pessoalmente, não era a primeira vez que ia encará-lo, já tinha o realizado antes. E, por isso, a preparação psicológica nos dias anteriores foi intensa. Às vezes, não importa quantas vezes você realize algo, algumas coisas "never get easy" - nunca ficam fácil. 

Começamos com quase 10 pessoas um pouco depois das 19h. Com o passar dos primeiros tiros de 100m, mais alguns chegaram.

Foi bom perceber que, desde o início, a maioria estava disposta a encarar o desafio. Vieram preparados. Os exercícios foram passando e, diferente dos outros que participei, a galera tava mais focada, não lembro de ouvir mimimi ou desculpas. Quem percebia que não ia continuar, simplesmente se retirava. Não precisava justificar pra ninguém. 

Ao mesmo tempo que havia um clima descontraído e familiar, a gente atrapalhava uns aos outros no agachamento, dificultando. Pressionava uns aos outros um pouco nas barras, na zoação, e assim foi.
burpees..



Aqui tenho que ressaltar que tive dificuldades nas precisões, não pelo número de repetições, mas as que estávamos fazendo requisitavam mais atenção e foco, senão poderíamos nos machucar. Muitos sentiram isso também, eu mesmo já tava começando a escorregar no meu próprio suor que se espalhava pelo pé e a cada precisão deixava mais escorregadio o muro.

De modo geral, as coisas fluíram bem até os climbs e planches, o cansaço muscular, suor e cãibras (vide werley e lucas hahah) já tinham sido internalizadas.


Climbs. Pra mim, senti-me fraco e um lixo, mas não podia reclamar. Não ao ver lucas climbando quase mordendo o muro, climbava com o cotovelo, descia pro cat, subia de novo, descia pro cat, subia de novo e de novo. 


Planches. No primeiro planche, werley não conseguiu nem subir na barra. No segundo, não subiu de novo. Na terceira, puxou o capiroto e subiu na raça. Uma repetição. Foi tentar fazer outro, os músculos não respondiam. E assim foi, de um em um, dois, três… parar não era uma opção

Não posso deixar de falar, mas a gente riu muito nesse momento. Não por ridicularizar, mas por todo mundo se identificar com esse momento de certa forma, aquele momento em que você acha que vai subir com tudo e os céus dizem: "DESÇAAA! Ninguém vai subir nessa porra não!"

Na parada de mão, morremos de rir juntos ao ver lucas ter uma cãibra no meio do ar, quando tava subindo. E wesley, que deve ter tido cãibras pela metade do corpo. hahah 

Momentos de sofrimentos juntos que vieram com doses de felicidade e amizade.


Enfim, os quadrupedais. 1km.

Diferente dos outros que participei, muitos chegaram até aqui. Aguardamos para começarmos juntos. Sabendo que no momento que um puxasse, todos começaríamos, ficamos uns dois, três minutos esperando. Não sei se esperando todos se sentirem preparados, mas aí, do nada, cabrine agachou e começou. Todos descemos na hora. 

Falar um pouco mais de minha experiência agora. Brunin fez os primeiros 100, logo depois cheguei. Cheguei e comecei a voltar já; brunin veio na hora. 200, respiramos, voltamos. 300, respira, 400, respira. Assim até 500. Nesse momento, quando íamos fechar 500… brunin: "Guh, chegar lá, bate e volta". Ao voltar, ainda no início, brunin: “Guh, se eu disser pra chegar, bater e voltar, você diz o quê?" (risos) "Eu não falo nada.", respondi.

Naquele momento se concretizou o que já estávamos sentindo desde o início: eu e brunin íamos acabar juntos. Não tinha mais eu ou ele, éramos o nós que iria até o fim. Vocês não sabem o quanto eu xinguei ele toda vez que ele dizia esse bate e volta. Tive que parar pra respirar alguns segundos algumas vezes, mas toda vez que eu fazia isso, pensava: "essa dor não é só minha"; "se eu não parar, ele não vai parar". Nossos punhos começaram a sentir um pouco, as pernas queimando direto… mas, em silêncio, juntos, continuávamos. Em certo momento ele disse: "um passo atrás do outro". Esse é um dos principais ensinamentos desses desafios longos. Não adianta se desesperar pelo futuro, pelo que tá lá na frente, é um exercício após o outro, uma repetição de cada vez. Em um momento você chega.

Nos últimos 100 metros, quando quase no fim, ele completa: "já que tamos muito cansados, vamo dificultar e ir mais rápido" (leia-se mais rápido, um pouco mais, não é aquela velocidade que "mascara" a dor). Aqui eu xinguei muito. Hahah Começou a arder a porra toda até o último centímetro que faltava. 

Quando acabamos; depois de descansar uns poucos minutos, percebemos que não éramos só nós a concluir juntos. Descemos e fomos acompanhar os outros, dentro de nossos limites. Lucas com as bolhas, dan dan suando que nem a peste e mão cortada, cabrine com a mão fudida tb, juh e werley que começaram juntos e tavam na mesma sintonia. Assim como eu e brunin, era "Wesley, vsf, eu te odeioooo!" por juh a cada passada no quadrupedal. hahah

Juh, que não ia fazer o desafio com a gente, fez o próprio treino e depois acompanhou observando de perto, teve que entrar na brincadeira. O que começou com um "Faça 100m com a gente"; fechou em mais de 1km no fim. Se puxamos ela, ela, pela força de vontade, puxávamo-nos em dobro a continuar. Esse é o espírito do parkour, resistir, persistir, ajudar, compartilhar. 

Cada força que fazíamos em nós mesmos, era um pouco de força que dávamos para os outros também. Demorei para entender no parkour o que significa "ser forte para sermos fortes juntos". Tinha que ser forte pra passar essa energia pros outros. A força é do grupo, compartilhada, se um está fraquejando, nos limites, temos que ser ainda mais fortes por ele.

Os últimos 100 metros, é difícil descrever. Cada um que completava 900, voltava e acompanhava quem ia fechar os 900. Uma vez, duas, três, até estarmos faltando a última ida.

Antes de sair, curiosamente, conversávamos sobre um assunto qualquer, cotidiano. E aí, descemos e fomos. Acompanhei mais cabrine e dan, que tavam mais atrás. E finalizamos. Muitos pela primeira vez tinham terminado. Nunca tinha visto tantos acabarem também.

Ainda faltava um guerreiro. Felipinho, que começou os quadrupedais depois, ainda faltava 200m. Na última ida dele, voltamos, pra terminar, dessa vez sim, todos. Ninguém vai ficar pra trás. "Start together, finish together" - Começamos juntos, terminamos juntos. Uma frase que só pode ser compreendida se vivida.

Preciso lembrar e chamar atenção pros dois iniciantes que fizeram quase todo o desafio. Primeiro contato com o parkour, e se mostraram determinados. Demoraram mais que a maioria, mas persistiram. Aguentaram.

Completar o desafio era o de menos. Treinar focado, determinado, sentir-se forte e fraco, trocar dores, frustrações e êxitos - e se divertir -, isso é parkour. 

Nem lembro mais que horas acabamos, creio que devia ser quase meia noite.

O fim?

Risos. Por causa de uma ideia imbecil, digo logo de dan dan, acordamos (mais imbecis ainda em concordarem) que faríamos 5km de corrida depois do Hércules. Eu, dan dan, cabrine e brunin. 

Nas primeiras centenas de metros, comentei com cabrine: "taquepariu, pernas fodidas, vou num ritmozinho de trote aqui". Logo depois, ao lembrar de tudo que passamos, pensei: "foda-se". E estourei o ritmo. Brunin, eu já sabia que viria (hahah), veio logo depois me acompanhar. Quase em total silêncio durante a corrida, mas novamente juntos em espírito, finalizamos juntos. Meia noite, correndo, nem víamos dan e cabrine mais, mas sabíamos que eles estavam fazendo também. E mais dois planches para todos, pra assinar o fim. 

No final não haviam troféus, medalhas ou glórias, flores, tvs ou reconhecimento vindo de um público espectador. Não. Haviam dores, bolhas, cicatrizes, suores, cansaço. 

E os melhores momentos da minha vida.
Uma família. 

Eu sei que não preciso dizer isso, mas muito obrigado. Muito obrigado a todos que fizeram o desafio, com êxito ou não. O espírito ainda existe. E, como ouvi de um amigo esses dias: "um sonho só morre quando você deixa ele morrer dentro de você."

- Vídeo curto desse dia


4 de mar. de 2015

E se eu nunca conseguir aquele pulo?

Texto e fotos por Juliana Fajardini
Grifos por Gustavo Ivo

Parkour. Uma dúvida, um desafio - serei capaz de fazer as coisas? Eu vejo os vídeos de parkour, ou vejo as pessoas fazendo precisões mais distantes, ou cats que exigem não apenas técnica, mas um certo desafio ao senso de integridade física, uma força física maior, sei lá. E batem umas travas. Desacredito-me. Essa foi uma das razões que me fizeram não ir atrás do parkour, por muito tempo. Medo de não ser pra mim. De eu não ser capaz de fazer esses negócios. O corpo não ser capaz de. A cabeça não ser capaz de.

De repente, um dia, fui praticamente puxada pra um treino, o que fez com que não parasse pra pensar muito nesses receios e simplesmente fosse. Daí o treino não exigiu que eu fizesse coisas impossíveis. Só... difíceis, em termos de resistência e força física, talvez. Ou que eu aceitasse "sofrer" um pouco. Ok. Isso eu consigo. Eu fiquei toda quebrada por alguns dias. risos. Mas não me senti incapaz. Senti que... precisava melhorar. Que queria ser mais forte. E assim eu achei que dava pra tentar mais um treino.

Ao invés de força, dessa vez exigiram agilidade, equilíbrio, coordenação. E atenção para entender movimentos básicos. Fui fazendo e sentindo onde funcionava. Onde não. E que queria repetir mais uma vez. Parar o treino para treinar (risos). E daí eu quis ir de novo. Pra melhorar o que era mais natural ou gostoso fazer. Pra entender o que tava ruim no que tava fazendo de modo travado.


Quando estou nesses momentos, nos meus pequenos desafios, os pequenos degraus... Os saltos distantes se diluem. A força ou habilidade que os outros têm ficam mais como exemplo, ou inspiração, ou feedback. Deixam de ser um lugar a que eu talvez não chegue. Tou tão preocupada em conseguir pisar sem o calcanhar tocar o chão que a precisão pra barra deixa de preocupar. Uma hora dessas, quem sabe, talvez eu chegue lá. Agora eu quero fazer quadrupedais pra ganhar força no abdômen, braços, pernas. E repetir as precisões e os cats até cansar. Se eu me afasto disso, e vou olhar os outros, por muito tempo… Os medos voltam. Mas geralmente eles duram até eu encontrar um obstáculo que acho que consigo ultrapassar. xP

Senti vontade de escrever sobre isso porque outro dia a irmã de um brother que pratica parkour apareceu no treino. Perguntei se ela tinha vontade de treinar. Ela respondeu que tinha curiosidade ou interesse, mas que não sabia se o corpo dela conseguiria fazer “aquelas coisas”. E isso me lembrou meus receios e bloqueios, e me dei conta de que, apesar deles, lá tava eu, tentando.

Escrevendo esse texto, penso que acho que rolam uns flows internos. O parkour é pra dentro. Aonde você vai com ele é o caminho que você “escolher” seguir. Sei lá. Quero dizer. Talvez eu nunca faça as coisas que meus amigos que treinam há anos fazem. Mas meu corpo tá se mexendo de um jeito que eu gosto. Dentro e fora. E tá se desafiando. Cheio de curiosidades.

O Brunin, que dizem as más línguas se chama Bruno Reis, lendo esse texto, alumiou: Com o Parkour, pequenos saltos podem ser grandes obstáculos ultrapassados. É… Acho que sinto isso. Cada um sabe de seus desafios…



Pra fechar… Essa percepção de que em algum momento eu paro de me preocupar bateu enquanto escrevia o texto. O dar-me conta disso. Acho que alternar os treinos de força/ resistência (psicológica) com os treinos de técnica (repetir, repetir, entender o que tá ruim, repetir) funciona pra mim. E ir construindo em cima dos treinos, raciocinando, internalizando. Cabeça e corpo vão aprendendo.

E percebi só agora que não me preocupo quando estou lá. Às vezes o que os tracers antigos fazem passa pela cabeça. Mas no geral tou muito ocupada pensando na posição do meu pé. risos

Metros não medem a distância de um salto no Parkour.
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